Prudente tem alguns poucos imóveis que foram tombados pelo seu valor cultural, com o objetivo de preservar a memória da sociedade prudentina, a exemplo do Centro Cultural Matarazzo, o Bebedouro Municipal, o Museu e Arquivo Histórico "Prefeito Antonio Sandoval Netto" e a chaminé e o galpão da antiga Sanbra. Mas não é só através do tombamento que um bem pode ser protegido pelo seu valor cultural (aí se compreendendo os valores arquitetônico, histórico, paisagístico, artístico e outros), pois isso pode ser feito também judicialmente ou por meio de termo de ajustamento de conduta (TAC) firmado com o Ministério Público (MP).
A Catedral de São Sebastião e a Praça Monsenhor Sarrion estão protegidas por um TAC, e a Praça Nove de Julho (inclusive a fonte que lá existe), o prédio do antigo Fórum, o prédio da Escola Arruda Mello e até mesmo o Centro Cultural Matarazzo estão igualmente protegidos por força de decisões judiciais, em ações promovidas pelo MP. Alguns destes imóveis ganharam proteção da lei em situações até pitorescas.
Sabe-se que, certo dia, alguns anos atrás, um telefonema de alguém que trabalhava na Prefeitura Municipal de Presidente Prudente fez um alerta ao Promotor de Justiça que cuidava do patrimônio cultural. Assustado, esse servidor disse que o decreto que havia tombado o prédio das Indústrias Matarazzo anos antes, tinha sido revogado e que o prefeito municipal pretendia, no dia seguinte, demolir aquela construção e iniciar a abertura de uma avenida. Confirmado o fato pelo então secretário da Cultura, que não concordava com essa decisão, foi redigida às pressas uma ação civil pública para tentar evitar a concretização de decisão tão inusitada.
No final da tarde, com a ação pronta, o promotor foi recebido pelo juiz a quem cabia decidir, que havia pouco tempo residia em Prudente. Num primeiro momento, depois de explicada a situação, lembrou-se ele onde ficava o Matarazzo, e disse: "Ah, são aqueles prédios velhos lá depois da linha de trem?" Bateu um desespero. Será que ele vai dar a liminar? E deu! Imediatamente a Prefeitura foi comunicada que não poderia demolir os prédios das Indústrias Matarazzo. Com esse impedimento, foi feito um acordo judicial para transformar aquele local num centro cultural, e isso foi feito. E está lá o Centro Cultural Matarazzo.
Proteger o patrimônio cultural não significa congelar a cidade, mas sim manter alguns aspectos que faz com que tenhamos um registro histórico da evolução, seja ela política, social, visual ou até mesmo da própria comunidade. Nada surgiu de repente, tudo foi resultado de uma série de acontecimentos que marcaram uma sociedade e, por isso, devem ser preservados, tal qual eram. Infelizmente, hoje alguns desses patrimônios culturais estão sendo alterados, a gosto de não sei quem, num afrontoso desrespeito à memória arquitetônica e histórica da cidade, a exemplo da fonte da Praça Nove de Julho.
Não se ouvem mais vozes que antes defendiam o patrimônio cultural da cidade. Ficaram mudas, estranhamente caladas.
Enquanto aspectos como esse forem ignorados continuaremos presenciando um urbanismo às avessas, uma verdadeira arquitetura da desconstrução da cidade.
Não podemos esquecer que a cidade deve refletir as qualidades de seus moradores. Uma sociedade apática produzirá uma cidade sem brilho. Somos nós, cidadãos urbanos, que damos alma à cidade.
ADAUTO LUCIO CARDOSO: Diretor Proprietário do Portal Grande Prudente, ex-secretário municipal de Presidente Prudente, foi diretor do Jornal a Gazeta de Assis, ex-assessor de imprensa da prefeitura de Assis, e editor de vários títulos de livros da APE -Assosciação Prudentina de Escritores.